Estudo: duplo choque pode ter tombado planeta Urano |
Atualmente, um dos grandes mistérios que pairam sobre o Sistema Solar é a
respeito da inclinação anômala do eixo de rotação de Urano, que se
acredita, tenha sido causado pelo impacto de um grande objeto. Agora,
uma equipe de pesquisadores internacionais, incluindo um brasileiro,
lança uma nova luz sobre o fenômeno.
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Por meio de simulações feitas em supercomputadores, a equipe do
astrônomo italiano Alessandro Morbidelli, ligado ao Observatório da Côte
d’Azur, em Nice, na França, obteve indícios bastante significativos de
que a inclinação exagerada do eixo uraniano não se deve a apenas um
forte impacto com um corpo do tamanho da Terra, mas sim a dois choques
com objetos de grande massa.
Enquanto a Terra gira ao redor de um eixo com 23 graus de inclinação, Urano rotaciona em torno de um eixo inclinado em 97.7 graus em relação ao plano de sua órbita ao redor do Sol.
"Os dois choques teriam ocorrido em momentos diferentes durante a fase de formação do planeta e isso explicaria por que Urano gira deitado", disse Rodney Gomes, do Observatório Nacional (ON), no Rio de Janeiro e um dos autores do estudo.
A hipótese foi apresentada em outubro, durante o Congresso Europeu de Ciência Planetária, ocorrido em Nantes, na França e poderá mudar a visão que os astrofísicos têm sobre os primeiros momentos da criação do Sistema Solar.
Formação
Há cerca de 4.5 bilhões de anos, um disco de gás e poeira girando em torno do Sol deu origem aos planetas. Nos primeiros milhões de anos esse material foi se agrupando, formando objetos cada vez maiores e maciços, semelhantes aos cometas e asteroides, chamados planetesimais.
Esses objetos passaram a colidir entre si, crescendo ainda mais até formaram os protoplanetas, corpos com tamanhos similares aos dos atuais planetas. Devido à ação da gravidade esses corpos capturaram o gás do disco que se dissipou nos primeiros milhões de anos, dando origem aos planetas gasosos e de gelo.
Os planetas rochosos se formaram após diversas colisões entre os protoplanetas restantes.
Mais choques
É fácil concluir que todos os planetas se formaram orbitando o mesmo plano do disco primordial de gás e poeira, com os eixos de rotação perpendiculares a esse plano. No entanto, novos choques entre planetas, planetesimais e protoplanetas continuaram a acontecer, alterando a inclinação de seus eixos.
A Terra, por exemplo, tem um eixo inclinado em 23 graus, responsável
direto pelas estações do ano. Urano, por sua vez, tem um eixo
absurdamente inclinado em 97.7 graus, fazendo com que seus polos sejam
dispostos "de lado", em vez "de cima e embaixo", como no caso da Terra.
Desde a década de 1960, os astrônomos especulam que essa obliquidade acentuada teria sido motivada por um violento choque entre Urano e um grande embrião planetário, mas essa teoria apresenta um problema: as diversas luas e anéis de Urano também giram em torno desse eixo de rotação altamente inclinado.
Segundo os críticos dessa hipótese, durante uma colisão tão forte não haveria tempo suficiente para que os satélites e anéis acompanhassem a inclinação de Urano. No entender dos críticos eles deveriam ter permanecido em plano orbital menos inclinado.
Nova teoria
Para explicar essa discrepância, os astrofísicos Gwenaël Boué e Jacques Laskar, ligados ao Observatório de Paris, propuseram em 2009 uma nova teoria. Segundo os pesquisadores, Urano teria tido no passado uma grande lua, do tamanho da Terra.
A presença do gigantesco satélite massivo teria feito com que o movimento de precessão do eixo de rotação do planeta, similar à oscilação produzida por um pião girando, se ampliasse lentamente em razão de uma série de interações, levando o planeta a “deitar”. Essa inclinação seria um fenômeno tão lento que os anéis e demais satélites acompanhariam o equador do planeta.
Sistema Caótico
O problema parecia estar solucionado, até que Gomes e Morbidelli passaram a examinar cuidadosamente a teoria e em 2010 se depararam com uma contradição. De acordo com os pesquisadores, a mesma influência gravitacional do satélite hipotético que teria feito Urano tombar também atrairia os demais satélites e anéis, o que impediria que eles acompanhassem o planeta em sua inclinação. Assim, para a dupla de pesquisadores a teoria de Boué e Laskar não estaria correta.
Os investigadores decidiram então retomar a ideia de uma colisão primordial, mas com algumas modificações.
Para isso realizaram uma série de simulações das interações gravitacionais que teriam ocorrido caso um corpo do tamanho da Terra tivesse de fato se chocado contra Urano durante sua infância, quando suas luas e anéis ainda não tinham se formado.
As simulações mostraram que o impacto teria deitado Urano e os detritos da colisão formado um segundo disco ao redor de seu equador. A influência gravitacional do disco interno teria feito com que o material do primeiro disco se espalhasse na forma de um toro (uma espécie de rosquinha), ao redor da faixa equatorial de Urano. Com o passar do tempo, o disco interno teria sido absorvido pelo planeta e o toro se achatado na forma de outro disco, dando origem às luas e anéis.
Duplo choque
Apesar da simulação explicar o tombamento de Urano, um detalhe chamou a atenção: as luas formadas giravam no sentido oposto ao da rotação de Urano, que é anti-horária. Para que o resultado da modelagem concordasse com a realidade, Gomes e Morbidelli concluíram que Urano deveria ter sofrido uma segunda colisão, ocorrida antes daquele que teria entortado tanto o eixo do planeta.
“Se aconteceram duas colisões dessa ordem, então deveria haver muitos embriões planetários do tamanho da Terra próximos de Urano naquela época”, diz Gomes.
Para o astrofísico brasileiro Wladimir Lyra, do Museu Americano de História Natural, em Nova York, essa é uma ideia interessante e inteiramente provável. “As pesquisas mostram que o sistema solar era um lugar caótico em seus primórdios. Houve muita interação entre os protoplanetas. Os oito planetas que vemos hoje são apenas os ‘vencedores’ de uma luta que ganharam à custa de algumas cicatrizes.”
Fotos: No topo, Urano, seus anéis e luas, em imagem capturada pelo telescópio espacial Hubble, em 24 de julho de 2005. Acima, Comparação dos diâmetros da Terra e Urano. Créditos: Nasa, Apolo11.com.
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Enquanto a Terra gira ao redor de um eixo com 23 graus de inclinação, Urano rotaciona em torno de um eixo inclinado em 97.7 graus em relação ao plano de sua órbita ao redor do Sol.
"Os dois choques teriam ocorrido em momentos diferentes durante a fase de formação do planeta e isso explicaria por que Urano gira deitado", disse Rodney Gomes, do Observatório Nacional (ON), no Rio de Janeiro e um dos autores do estudo.
A hipótese foi apresentada em outubro, durante o Congresso Europeu de Ciência Planetária, ocorrido em Nantes, na França e poderá mudar a visão que os astrofísicos têm sobre os primeiros momentos da criação do Sistema Solar.
Formação
Há cerca de 4.5 bilhões de anos, um disco de gás e poeira girando em torno do Sol deu origem aos planetas. Nos primeiros milhões de anos esse material foi se agrupando, formando objetos cada vez maiores e maciços, semelhantes aos cometas e asteroides, chamados planetesimais.
Esses objetos passaram a colidir entre si, crescendo ainda mais até formaram os protoplanetas, corpos com tamanhos similares aos dos atuais planetas. Devido à ação da gravidade esses corpos capturaram o gás do disco que se dissipou nos primeiros milhões de anos, dando origem aos planetas gasosos e de gelo.
Os planetas rochosos se formaram após diversas colisões entre os protoplanetas restantes.
Mais choques
É fácil concluir que todos os planetas se formaram orbitando o mesmo plano do disco primordial de gás e poeira, com os eixos de rotação perpendiculares a esse plano. No entanto, novos choques entre planetas, planetesimais e protoplanetas continuaram a acontecer, alterando a inclinação de seus eixos.
Desde a década de 1960, os astrônomos especulam que essa obliquidade acentuada teria sido motivada por um violento choque entre Urano e um grande embrião planetário, mas essa teoria apresenta um problema: as diversas luas e anéis de Urano também giram em torno desse eixo de rotação altamente inclinado.
Segundo os críticos dessa hipótese, durante uma colisão tão forte não haveria tempo suficiente para que os satélites e anéis acompanhassem a inclinação de Urano. No entender dos críticos eles deveriam ter permanecido em plano orbital menos inclinado.
Nova teoria
Para explicar essa discrepância, os astrofísicos Gwenaël Boué e Jacques Laskar, ligados ao Observatório de Paris, propuseram em 2009 uma nova teoria. Segundo os pesquisadores, Urano teria tido no passado uma grande lua, do tamanho da Terra.
A presença do gigantesco satélite massivo teria feito com que o movimento de precessão do eixo de rotação do planeta, similar à oscilação produzida por um pião girando, se ampliasse lentamente em razão de uma série de interações, levando o planeta a “deitar”. Essa inclinação seria um fenômeno tão lento que os anéis e demais satélites acompanhariam o equador do planeta.
Sistema Caótico
O problema parecia estar solucionado, até que Gomes e Morbidelli passaram a examinar cuidadosamente a teoria e em 2010 se depararam com uma contradição. De acordo com os pesquisadores, a mesma influência gravitacional do satélite hipotético que teria feito Urano tombar também atrairia os demais satélites e anéis, o que impediria que eles acompanhassem o planeta em sua inclinação. Assim, para a dupla de pesquisadores a teoria de Boué e Laskar não estaria correta.
Os investigadores decidiram então retomar a ideia de uma colisão primordial, mas com algumas modificações.
Para isso realizaram uma série de simulações das interações gravitacionais que teriam ocorrido caso um corpo do tamanho da Terra tivesse de fato se chocado contra Urano durante sua infância, quando suas luas e anéis ainda não tinham se formado.
As simulações mostraram que o impacto teria deitado Urano e os detritos da colisão formado um segundo disco ao redor de seu equador. A influência gravitacional do disco interno teria feito com que o material do primeiro disco se espalhasse na forma de um toro (uma espécie de rosquinha), ao redor da faixa equatorial de Urano. Com o passar do tempo, o disco interno teria sido absorvido pelo planeta e o toro se achatado na forma de outro disco, dando origem às luas e anéis.
Duplo choque
Apesar da simulação explicar o tombamento de Urano, um detalhe chamou a atenção: as luas formadas giravam no sentido oposto ao da rotação de Urano, que é anti-horária. Para que o resultado da modelagem concordasse com a realidade, Gomes e Morbidelli concluíram que Urano deveria ter sofrido uma segunda colisão, ocorrida antes daquele que teria entortado tanto o eixo do planeta.
“Se aconteceram duas colisões dessa ordem, então deveria haver muitos embriões planetários do tamanho da Terra próximos de Urano naquela época”, diz Gomes.
Para o astrofísico brasileiro Wladimir Lyra, do Museu Americano de História Natural, em Nova York, essa é uma ideia interessante e inteiramente provável. “As pesquisas mostram que o sistema solar era um lugar caótico em seus primórdios. Houve muita interação entre os protoplanetas. Os oito planetas que vemos hoje são apenas os ‘vencedores’ de uma luta que ganharam à custa de algumas cicatrizes.”
Fotos: No topo, Urano, seus anéis e luas, em imagem capturada pelo telescópio espacial Hubble, em 24 de julho de 2005. Acima, Comparação dos diâmetros da Terra e Urano. Créditos: Nasa, Apolo11.com.
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