Páginas

segunda-feira, 2 de maio de 2016

RAIOS GAMA ESTÃO SE ACELERANDO EM UMA ENERGIA SEM PRECEDENTES:




Nuvens moleculares gigantes em torno do centro galáctico, bombardeadas por energias extremamente elevadas de prótons, acelerando na vizinhança do buraco negro central e posteriormente brilhando como raios gama. Crédito: ©Dr. Mark A. Garlick/H.E.S.S.

Durante mais de 10 anos o observatório H.E.S.S. na Namíbia, dirigido por uma colaboração internacional entre 42 instituições de 12 países, vem mapeando os raios gama de energia muito elevada no centro da galáxia Via Láctea. Estes raios gama são produzidos pelos raios cósmicos da região mais interna da galáxia. Uma última análise detalhada dos dados do H.E.S.S. publicado em 16 de Março de 2016 na revista Nature, revela pela primeira vez uma fonte de radiação cósmica de energias nunca antes observada na Via Láctea: o buraco negro supermassivo no centro da galáxia está acelerando os raios cósmicos de energias 100 vezes mais do que o maior acelerador de partículas terrestre, o LHC no CERN.

A Terra é constantemente bombardeada por partículas de alta energia (prótons, elétrons e núcleos atômicos) de origem cósmica, partículas que compõem a chamada “radiação cósmica”. Estes “raios cósmicos” são eletricamente carregados e são portanto, fortemente desviados pelos campos magnéticos interestelares que permeiam a galáxia Via Láctea. Seu caminho através do cosmos segue ao acaso em função destes desvios, o que torna impossível identificar diretamente as fontes astrofísicas responsáveis pela sua produção. Assim, por mais de um século a origem dos raios cósmicos continua sendo um dos mistérios mais duradouros da ciência.

Artigo Relacionado: Atualização de DNA Acontecendo

Felizmente os raios cósmicos interagem com a luz e o gás na vizinhança de suas fontes produzindo raios gama. Estes raios gama viajam em linha reta, não sendo defletidos por campos magnéticos e, portanto, podem ser rastreados até a sua origem. Quando um raio gama de energia muito alta atinge a Terra, ele interage com uma molécula na atmosfera superior produzindo uma chuva de partículas secundárias, que emitem um pequeno pulso de “luz Cherenkov“. Ao detectar esses flashes de luz usando telescópios equipados com grandes espelhos fotodetectores sensíveis e eletrônicos extremamente rápidos, mais de 100 fontes de raios gama de energia muito alta foram identificadas ao longo das últimas três décadas. O observatório H.E.S.S. (Sistema Estereoscópico de Alta Energia) na Namíbia representa a última geração de tais matrizes de telescópio.

Hoje sabemos que os raios cósmicos com energias até cerca de 100 Teraelétron-volts (TeV) são produzidos na Via Láctea por objetos como restos de supernovas e pulsar de vento de nebulosas. Teoricamente argumentando e pelo que as medidas diretas dos raios cósmicos que atingem a Terra indicam, as fábricas de raios cósmicos na Via Láctea são capazes de fornecer partículas de até um pentaeletrovolt (PEV) pelo menos. Apesar de muitos aceleradores multi-TeV terem sido descobertos nos últimos anos, a procura pela fonte dos raios cósmicos galácticos de energia mais alta tem até agora se revelado infrutífera.

Observações detalhadas da região do centro galáctico feitas pelo H.E.S.S. ao longo dos últimos 10 anos e publicado na revista Nature, finalmente fornecem indicações diretas sobre a aceleração dos raios cósmicos PeV. Durante os três primeiros anos de observações o H.E.S.S. descobriu uma fonte muito poderosa de raios gama na região do centro galáctico, bem como a emissão de raios gama difuso das nuvens moleculares gigantes que o rodeiam em uma região de aproximadamente 500 anos-luz de diâmetro. Estas nuvens moleculares são bombardeadas por raios cósmicos que se deslocam à velocidade da luz e produzem raios gama através de suas interações com a matéria nas nuvens. Uma notável e boa coincidência espacial entre os raios gama observados e a densidade do material nas nuvens indicou a presença de um ou mais aceleradores de raios cósmicos nessa região. No entanto, a natureza da fonte permanece um mistério.

Observações mais profundas obtidas pelo H.E.S.S. entre 2004 e 2013 trouxeram uma nova luz sobre os processos que alimentam os raios cósmicos na região. De acordo com Aion Viana (MPIK, Heidelberg), “a quantidade sem precedentes de dados e os progressos realizados em metodologias de análise nos permitem medir simultaneamente a distribuição espacial e a energia dos raios cósmicos.” Com estas medições únicas do H.E.S.S. os cientistas são capazes pela primeira vez de identificar a origem destas partículas: “Em algum lugar dentro dos 33 anos luz do centro da Via Láctea existe uma fonte astrofísica capaz de acelerar prótons a energias em cerca de um pentaeletrovolt continuamente durante pelo menos 1.000 anos”, diz Emmanuel Moulin (CEA, Saclay). Em analogia com o “Tevatron”, o primeiro acelerador humano que alcançou energias de 1 TeV, esta nova classe de aceleração cósmica tem sido apelidada de “Pevatron”. “Com o H.E.S.S. agora somos capazes de rastrear a propagação de prótons PEV na região central da galáxia”, acrescenta Stefano Gabici (CNRS, Paris).

O centro da galáxia é o lar de muitos objetos capazes de produzirem raios cósmicos de alta energia, incluindo em particular o restante de uma supernova, o pulsar de ventos de nebulosas e um conjunto compacto de estrelas massivas. No entanto, “o buraco negro supermassivo localizado no centro da galáxia chamado de Sgr A *, é a fonte mais plausível dos prótons PEV”, diz Felix Aharonian (MPIK, Heidelberg e Dias, Dublin), acrescentando que: “várias possíveis regiões de aceleração podem ser consideradas quer na proximidade imediata do buraco negro, ou mais longe, em que uma fração do material que cai dentro do buraco negro é ejetado de volta para o ambiente, iniciando-se assim a aceleração de partículas.”

As medições do H.E.S.S. da emissão de raios gama podem ser usadas para inferir o espectro dos prótons, que foram acelerados pelo buraco negro central revelando que é muito provável que Sgr A* está acelerando em PeV as energias dos prótons. Atualmente estes prótons não podem explicar o fluxo total dos raios cósmicos detectados na Terra. “Se, no entanto, o buraco negro central da galáxia fosse mais ativo no passado”, os cientistas argumentam: “então ele poderia realmente ser responsável pela maior parte dos raios cósmicos galácticos que são observadas hoje na Terra.” Se for verdade, isso iria influenciar drasticamente o debate de um século sobre a origem destas partículas enigmáticas.

Para explorar mais: Fermi usa raios gama para descobrir pistas sobre o espaço “vazio”.

Mais informações: A. Abramowski et al. Aceleração de prótons pentaeletrovolt no Centro Galáctico, Nature (2016). DOI: 10.1038/nature17147.

Referência da revista: Nature

©CNRS

Origem: phys

Tradução e Divulgação: A Luz é Invencível

Nenhum comentário:

Postar um comentário